domingo, 2 de dezembro de 2007

Filme - Tropa de Elite (Brasil, 2007)

Quando o filme começa a virar moda, eu começo a ficar com o pé atrás com ele. E além disso, o pessoal começou a comentar tanto, que eu pensei que quando fosse assistir saberia quase tudo que fosse acontecer, e realmente foi isso mesmo que ocorreu. Mas ainda assim o filme é bom, mas não tanto quanto o povo fala.
Vou tentar falar de um ponto de vista pessoal e não tão comentado: a dureza do trabalho em certas instituições. Quando o cara vai pedir férias para o seu superior, depois de estar quatro anos sem tirar férias, não consegue e ainda sai humilhado. No meu emprego, como consultor de uma empresa de desenvolvimento de sistemas, além do inconveniente de ter 15 dias, e não um mês de férias, para se conseguir tirar estes 15 dias é uma dureza. A hierarquia e a necessidade, assim como na polícia, é um problema. Você precisa daquele emprego, e tem que se submeter ao seu superior. E no meu caso, é difícil tirar férias porque está tudo voltado a projetos, é difícil você abandonar um projeto no meio. Mesmo o Capitão Nascimento passa pelo mesmo problema, não conseguindo conciliar casamento e gravidez da mulher com o emprego na polícia.
Do ponto de vista estético, acho que as imagens do treinamento poderiam ser melhores, a fim de dar um impacto maior, enfatizando a crueldade do treinamento. A cena da comida, devido à luz, não dá pra ver direito o que é.
Uma das cenas mais engraçadas é a da granada, e os termos e frases usados no filme são ótimos, uma delas é: “O senhor é um fanfarrão”.
E é muito legal o jeito que o policial corrupto é zoado no treinamento. Gostei também da opinião corajosa, que o usuário de drogas é sim responsável pelo tráfico, só pra poder curtir um barato, alimenta uma indústria cruel.

60, 70, 80 e 90

Cada década tem certas características e estilos próprios, que lhe dão uma identidade.
Os anos 60 assistiram à uma grande popularização do rock’n’roll; porém como era ainda algo em estágio inicial, era algo meio inocente e ingênuo ainda, descobriram os excessos no final da década, quando a psicodelia foi descoberta, em meados de 1967.
Porém, nos anos 70, o exagero foi a principal característica, tudo que foi descoberto em matéria de abuso e psicodelia no final dos anos 60, aqui foi plenamente desenvolvido, incluindo muitas drogas e sexo livre.
Vindo como uma espécie de preço a se pagar, parece que a AIDS foi descoberta no começo dos anos 80, e parece que isso jogou um balde de água fria na bagunça dos anos 70, e os anos 80 foram dos mais caretas ideologicamente e esteticamente (não que as pessoas fossem caretas em matéria de restrição de uso de drogas, os yuppies cheiravam muita cocaína), com bandas de rock gótico ou pós punk inglês, onde o tédio e a tristeza dominam, juntamente com um instrumental cheio de sintetizadores e baterias eletrônicas, que é algo bastante broxante na maioria das vezes.
Os anos 90 parece que vieram como uma tentativa de retomada do som de guitarras e bateria de verdade dos anos 70, só que impregnados pelo niilismo de bandas como o Nirvana. O rock alternativo em geral tentou também fazer meio que uma volta aos anos 70, ou então aos anos 60, principalmente o indie rock mais inofensivo.
Pensei em escrever este lance sobre as décadas porque comecei a reparar que quase tudo que eu ouço são sons da década de 70. Como presto muita atenção em timbres, tenho uma tendência a não gostar de quase nada dos anos 80, porque se perdeu aquele som de guitarras, baixo e baterias orgânicos dos anos 70.
Talvez o maior vilão dos anos 80 para a música tenha sido a pasteurização do som. Talvez no leite seja bom, mas para a música, tirou quase que todo o gosto. Até artistas que tinham discos com timbres muito bons nos anos 70, nos anos 80 deram uma piorada. Tudo em nome da modernidade. Só que neste caso, a modernidade geralmente foi para mudar as coisas para pior. Até hoje eu me pergunto: para que usar tanta bateria eletrônica, se a bateria acústica tem talvez mil vezes mais dinâmica de som? Para que deixar o baixo tão sem graça, depois dos grooves alucinantes dos funks de James Brown? Por que esse ataque tão forte à psicodelia e às músicas longas? Seria pela substituição do LSD pela cocaína?
Apesar do Jimi Hendrix ser dos anos 60, seu estilo é totalmente anos 70, uma mistura explosiva de rock, funk, blues e psicodelia.
Alguns dos principais estilos dos anos 70 que eu gosto muito de ouvir:

- Brega: o mais legal do brega está, indiscutivelmente, nos anos 70. Roberto Carlos fazia músicas românticas já nos anos 60, mas ainda eram muito inocentes, ele mesmo começou a pegar pesado na fossa nos anos 70. Os arranjos dos bregas dos 70 estão entre os mais geniais da história da música: baixo e bateria meio suíngados, com o baixo fazendo aquela linha bem característica do brega, guitarra com ótimos timbres, naipe de sopros e quarteto de cordas de verdade, e não strings de teclado. Era uma época no Brasil em que tudo tinha uma aura de cafajestagem, tanto nos filmes (pornô-chanchadas), no teatro e na literatura (Nelson Rodrigues, Jece Valadão), quanto nas roupas (estilo Augustinho da Grande Família), nas proibições e polêmicas (anticoncepcionais, divórcio), o crime passional de Lindomar Castilho. A lista de artistas que lançaram excelentes discos nesta época é grande: Bartô Galeno, Genival Santos, Odair José, Waldik Soriano, Agnaldo Timóteo, etc.

- Funk: essa foi a época de ouro do estupendo James Brown, talvez o som mais contagiante e cheio de energia do mundo; ele contava com músicos excelentes, e era praticamente impossível ficar parado com suas músicas. E tudo com instrumentos de verdade, onde o baixo e a bateria eram, quase que invarialmente, matadores. E aqui no Brasil tínhamos Tim Maia, que misturou funk da melhor qualidade com ritmos genuinamente brasileiros, e deixando tudo ótimo. E ainda, para contribuir com o clima esotérico e psicodélico da época, Tim entrou na seita da Cultura Racional, dos livros Universo em Desencanto. Além disso tinha: The Meters, Sly and The Family Stone, etc.

- Reggae e dub: tente achar, hoje em dia, algum disco que tenha os mesmos graves e sons de baixo tão legais quanto os de alguns discos clássicos do Lee Perry, “Super Ape” e “Roast Fish...”. Além disso, tinha o Bob Marley, Peter Tosh, Delroy Wilson. O clima dos discos gravados naquela época tinha todo um sabor especial, que a modernidade tirou. Talvez os discos de reggae e dub gravados nessa época estejam o mais próximo possível do que possa se chegar a tentar reproduzir em sons os efeitos da marijuana.

- Rock progressivo: muita gente fala, até com uma certa razão, da chatice de alguns discos de rock progressivo, que se perdiam em solos intermináveis, em idéias sem pé nem cabeça. Por outro lado, o rock progressivo proporcionava viagens que dificilmente outros estilos proporcionam, se você estivesse no clima, você iria até Marte ou Saturno e voltava. O King Crimson tinha um puta som legal de baixo, bateria e, melhor, mellotron, instrumento que infelizmente quase que deixou de ser usado hoje em dia, que traz todo um clima de melancolia. O Pink Floyd fazia longas suítes que beiravam a perfeição, como “Shine On You Crazy Diamond”, “Dogs”. Yes falava de duendes e de Atlântida. O clima esotérico deixava a coisa mais interessante ainda, com todas aquelas alegorias; lembra uma viagem a São Tomé das Letras, por exemplo. O agnosticismo e o niilismo podem ser mais difíceis de ser contestados, mas enquanto estes são insípidos, o clima esotérico do rock progressivo tem a ver com o perfume místico indiano, por exemplo. Hoje em dia, ou as pessoas tem vergonha de ser progressivo, ou estas coisas não chegam mais a nós.

- Hard Rock e Heavy Metal: foi nessa década que surgiram (ou pelo menos “floresceram”) as principais e mais influentes bandas de rock pesado de todos os tempos: Deep Purple, Black Sabbath e Led Zeppelin. Black Sabbath deu origem à todo heavy metal, com riffs lentos e sombrios; Deep Purple, com ritmo forte e psicodelia de discos como “Made In Japan”, por exemplo; Led Zeppelin criou alguns dos maiores clássicos de todos os tempos, misturou música oriental, em “Kashmir”, mexeu com magia negra. Uma banda que pouca gente conhece, mas é uma estupenda mistura da bateria do punk rock, riffs de heavy-metal e a psicodelia do rock-progressivo, é o Hawkwind, que soa mais ou menos como um Black Sabbath mais psicodélico ou como um Pink Floyd mais pesado, e foi a primeira banda do Lemmy do Motorhead, banda esta, inclusive, está entre as minhas favoritas; aquele disco “Ace Of Spades” é bom pra cacete.


- Punk rock: apesar do punk rock ter sepultado o rock progressivo, existiram muitas bandas legais de punk rock em seu início. Nada contra uma volta à simplicidade, o problema é que as viagens psicodélicas ficaram sendo alvo de muito preconceito. Outro grande problema do punk era que quase sempre queriam dar prioridade à política, deixando o som em segundo plano. Ainda bem que uma das principais bandas do punk, e uma das mais legais também, se preocupou em atualizar o som pop-rock dos anos 60, imprimindo mais simplicidade e mais peso: Ramones. Outra banda que gosto muito são os Dead Kennedy’s, que mostrou que o punk-rock não precisa ser burro e sempre igual, fazendo psicodelia de um modo mais simples e agressivo. Agora, o The Clash tinha sons legais, mas queria fazer muita política. O Sex Pistols criaram o lance da imagem punk, e apesar de serem acusados de fabricados, tem músicas que são verdadeiros clássicos da fúria, como “Anarchy in the UK”. Uma das coisas que mais admiro no Sonic Youth é que eles fizeram, entre outras coisas, uma mistura de punk e progressivo.

- Obscuros: Destroy All Monsters, uma banda que falarei com mais detalhes no futuro, foi uma das banda mais pioneiras e criativas no uso do noise e do experimentalismo no rock.

- No Wave: falei em outro post sobre esse que é um dos mais intensos, agressivos e enérgicos movimentos que já existiram no rock, unia punk rock com música experimental de vanguarda, de modo a gerar o som mais incômodo, irritante e agressivo possível. Dependendo do ponto de vista, pode ser uma espécie de transição da psicodelia ao niilismo, como no documentário “Kill Your Idols”, que mostra aquele colorido todo dos Rolling Stones em contraposição ao branco e preto do Suicide. Porém, se as bandas dos anos 80 tivessem pelo menos 10% da energia destas bandas, elas já teriam pelo menos o dobro de animação, pois aquele tédio todo do pós-punk e gótico, sinceramente não dá. Ainda bem que teve uma banda que deu uma seqüência boa a esta estética nos anos 80, apesar deles serem mais melódicos: Sonic Youth.

Como eu li num lugar, os anos 80 foram tão terríveis que até os Ramones fizeram disco ruim nesta década. Pode ouvir e comparar: discos dos anos 70 e 80 de Bartô Galeno, artistas de reggae, discos do Tim Maia, discos de progressivo, etc.

27

Quem acredita em astrologia diz que 27 anos é, em geral, uma idade crucial na vida das pessoas, devido ao famigerado retorno de Saturno. Coincidência ou não, alguns dos artistas mais importantes da história do rock morreram justamente com essa idade:
- Jimi Hendrix
- Jim Morrison
- Janis Joplin
- Kurt Cobain

1967

Quase tudo que acontece no rock hoje é, em boa parte, influenciado pelos discos que foram lançados neste ano mítico.
O Sonic Youth e o rock alternativo em geral, é descendente direto da mistura entre melodia e ruído, pop e experimentalismo, que o Velvet Underground fez em seu primeiro disco, “Velvet Underground & Nico”. Este disco estava anos-luz à frente do disco que os Beatles lançaram neste mesmo ano, “Sgt. Pepper’s Lonely Heart Club Band”. Equanto os Beatles estavam na onda da psicodelia colorida, do lsd, do esoterismo e de gurus indianos, o Velvet Underground estava na onda da heroína, do niilismo, do experimentalismo áspero.
No mesmo ano, o Jimi Hendrix também lançou seu primeiro disco, “Are You Experienced?”, que continha vários de seus clássicos, e foi um dos discos mais revolucionários no que diz respeito ao uso da guitarra no rock.
Também em 1967, o The Doors lançou seu primeiro disco, auto-intitulado “The Doors”, que contém dois de seus maiores hits, “Break On Through” e “Light My Fire”, além da barra-pesadíssima “The End”, com sonoridade oriental e com letra edipiana, em que ele fala que quer matar o pai e foder a mãe (se isso soa chocante hoje, imagine a 40 anos atrás).
Como se não bastasse, também é o ano do lançamento do primeiro disco do Pink Floyd, ainda com o Syd Barrett. Não sou tão fanático pela fase do Syd Barrett, como a maioria dos indies e críticos, gosto mais da estrutura de músicas da fase do Roger Waters, músicas mais longas e lentas, mas esse disco do Pink Floyd tem “Interestellar Overdrive”, uma obra-prima da psicodelia, que possivelmente deu origem a quase todo rock progressivo, e por conseqüência ao pós-rock, com 9 minutos de pura viagem, é só instrumental, é guitarra, baixo, bateria e órgão, mas tocados de uma forma que soa atual até hoje.
E, uma outra especulação é que os anos com finais 7 tenham alguma coisa especial, pois 10 anos após, em 1977, foi o ano em que surgiu o punk-rock. Em 1987 eu não sei de nada tão revolucionário, inclusive eu passo longe de quase tudo que se relacione aos anos 80. Em 1997, o Radiohead criou um dos discos considerados como dos mais revolucionários no rock em muito tempo, o “Ok Computer”. Agora em 2007 o mesmo Radiohead inovou, possibilitando que seus fãs baixem o disco pela internet, pagando o que quiserem pelo disco, desde zer libras até 500 (ou mais).

Rascunhos da memória de um grande amor

Tanto tempo sem te ver, tanta falta você me faz, mas não tem revolta não, saudade até que é bom, é melhor do que caminhar vazio.
Você me ensinou tanta coisa sobre a vida, como vive-la, como aproveita-la.
Vou vivendo e só te encontro nos meus sonhos
E cada dia mais distante os olhos que não posso ver
Você está a milhares de quilômetros de distância

Fomos tão longe que agora não sei como voltar
Você me levou ao paraíso e agora não sei como voltar

Diga que você não me esqueceu
Escreva pelo menos uma palavra

Você me magoou tanto,
Que me fez eu te magoar também
E você agora finge que nem me conhece direito

Mas você foi tão especial
Que depois de você não apareceu mais ninguém

Agora eu fico lembrando e sonhando com tudo que vivemos
O beijo que você me deu, eu guardo até hoje o calor

Apesar da saudade ser tão grande, o meu coração fica feliz em lembrar todos os nossos momentos, as tardes que passamos juntos. Ficávamos nos curtindo, nos amando. Foram momentos tão intensos, e eu ainda não tinha tantas responsabilidades. Ou então foram momentos tão intensos por eu não ter tantas responsabilidades. Sinto saudade das tardes despreocupadas que passamos juntos. Como você me ensinou a ser despreocupado! E eu te agradeço tanto por isso. O primeiro fim de semana em que nos conhecemos, você se dedicou em tempo integral a mim, preparou um programa completo para conhecer todos os recantos de sua cidade, e aproveitamos e nos conhecemos também.

Andamos quase o dia inteiro num calor de rachar, próximo à praia, eu de calça jeans e sapato, com minha mala nas costas. Subimos para o Cristo Redentor, no trenzinho que levava até lá em cima, te abracei e sentia cada toque sutil e suave em qualquer pedaço que fosse do seu corpo. Ao ter aquela vista linda, instintivamente nos abraçamos, era o que estávamos querendo durante o dia inteiro. Foi um beijo diferente, estávamos com a boca tão seca, que não pudemos curti-lo tanto.

Eu acho que escrevia melhor quando tínhamos algo, quase tudo que eu escrevia era dedicado a você, complementos do que tínhamos passado durante o tempo que estivemos juntos, você escrevia textos de páginas e páginas, relembrando o que tínhamos passado, ou então ficávamos fazendo planos para o futuro.

Mas as pessoas são diferentes, e talvez por não aceitarmos algumas coisas um do outro, fomos nos distanciando. Talvez foi isso, talvez você simplesmente deixou de me amar, talvez você deixou de me amar porque estava amando outra pessoa.

Você dizia que se relacionou com alguém que dizia que você não sabia amar. Nunca julguei os sentimentos de ninguém, sempre respeitei-os. E acho que você me mostrou uma outra forma de amar, não tão possessiva. Mas você me magoou, e isso fez eu te magoar, e agora isso faz com que estejamos a milhões de quilômetros de distância.

Brega de A a Z - Bartô Galeno






(Demorei para postar esse texto, porque queria deixá-lo bem completo, já que este é um de meus artistas preferidos, e um de meus maiores ídolos)

Sem dúvida, um dos melhores e mais importantes artistas do brega. Existem vários outros bons cantores de brega, mas poucos são tão passionais quanto Bartô Galeno. Conheci a música de Bartô Galeno em um dos momentos mais difíceis da minha vida: o término de um namoro de três anos e meio. Foi uma combinação perigosa, pois a música de Bartô Galeno é uma das mais passionais de todo o brega; e a noite foi longa, não conseguia dormir lembrando trechos das músicas: "o que foi que fizeram com ela, que ela chorou?" (Sorriso de Moça), "e eu sei que não vou ser feliz nunca mais" (Só Lembranças), "quando agora for passado, vou lembrar que fui coitado" (Sorriso Forçado).
Porém, hoje em dia, ouço-as sem o sofrimento de outrora, mas claro que quase sempre com uma vontade de beber. São músicas lindíssimas, apesar de algumas serem bastante tristes. Bartô Galeno é uma epítome do brega, o meu cantor preferido de brega, com ótimas músicas e arranjos somadas a uma excelente voz e uma interpretação passional.
A sua temática é quase sempre a dor de corno, e musicalmente está na vertente das baladas românticas.
Por causa de seu acentuadíssimo tom passional, não é de fácil assimilação por todos que gostem de músicas românticas, como é o caso do Amado Batista, mais pop, e por isso mais aceito.
Interessante que a sua música, além de toda a deprê associada, também causa uma espécie de torpor.
Em um boteco aqui perto de casa, o Boteco do Toninho, foi onde aprendi muito sobre o brega, e o dono além de ter muitos vinis do Bartô, também teve a oportunidade e a honra de abrir um show do mestre.

O clássico: No toca-fitas do meu carro

Antes de eu comprar, fazia um tempo que eu havia ouvido uma frase do refrão de sua música mais famosa numa propaganda daquelas coletâneas de músicas dos anos 70, e ficava repetindo e irritando as pessoas mais próximas, por só saber aquela frase, mas que eu sabia, era um dos maiores clássicos do brega: "No toca-fitas do meu carro". Eu fiquei impressionado: que nome de música genial!
Na primeira estrofe já aparecem algumas imagens que nos levam direto aos anos 70: um carro, que provavelmente deve ser algo como um corcel, um toca-fitas, o cigarro:

No toca-fitas do meu carro,
Uma canção me faz lembrar você,
Acendo mais um cigarro,
E procuro lhe esquecer

A dor aumenta quando ele constata que o banco do passageiro está vazio, e essa ausência só faz seu amor aumentar:

Do meu lado está vazio
Você tanta falta me faz
E cada dia que passa
Eu te amo muito mais

Até aqui, é uma música romântica tradicional, somente com algumas imagens peculiares a distinguindo. Porém, é a próxima estrofe que caracteriza um brega autêntico, onde o cantor não se contenta em lembrar da pessoa amada, ele quer saber é de sofrer pra valer, colocar o dedo bem fundo na ferida:

Encontrei no porta-luvas,
Um lencinho que você esqueceu
E num cantinho bem bordado
O seu nome, junto ao meu

A manguaça

Em um boteco aqui perto de casa, o Boteco do Toninho, foi onde aprendi muito sobre o brega, e o dono além de ter muitos vinis do Bartô, também teve a oportunidade e a honra de abrir um show do mestre. Segundo o Toninho, antes do show, o Bartô Galeno já tinha tomado várias, e queria mais. Pediu mais um whisky para o dono do bar, que disse: "Primeiro você faz o show e depois você bebe. Olha o estado em que você está". Bartô Galeno não pensou duas vezes, pegou o tinha na mão e tacou no dono do bar. Ao subir no palco, onde cantaria umas três músicas, caiu de bêbado. Hoje em dia, percebe-se em seus discos, uma voz curtida anos e anos na cachaça.

Show em Serra Pelada

Outra história engraçada que eu li numa entrevista sua foi uma que, quando ele foi fazer show no garimpo de Serra Pelada, numa altura do show, o pessoal começou a atirar para o alto, Bartô que ficou com medo e perguntou para o organizador do show o que era aquilo, que respondeu: “fica tranqüilo, Bartô, se eles estão atirando é porque estão gostando”.

Tristeza, sofrimento e tragédia

Bartô Galeno tem músicas que parecem Joy Division parecer brincadeira de criança. "Sorriso de Moça" é um dos melhores exemplos. Num arranjo todo em acordes menores, a música fala do sofrimento de uma menina inocente que entregou todo o seu amor, e hoje é uma mulher desiludida e vítima de uma maldade: "O que foi que fizeram com ela que ela chorou / ela era feliz e cantava cantigas de amor / hoje vive calada e tão triste num canto sozinha / nem parece a moça bonita que ontem sorria / Seu sorriso de moça bonita / alguém carregou / ela hoje é mulher / e a vida já não tem valor".

Outra música, que apesar de também trazer sorriso no nome, é uma das suas mais tristes e belas canções, é "Sorriso Forçado". A música começa com ele dizendo que "quando agora for passado, vou lembrar que fui coitado"; porém, traz uma esperança típica dos românticos, "meu sorriso que é forçado, vai ser livre e demorado, pois a vida que eu sonhei, eu sei que vai chegar". Fala da mulher que sorri agora, enquanto ele chora, mas um dia chegará sua vez de também sorrir, isso com um lindo solo de cordas e oboé ao fundo: "Você sorri de mim agora, se esquecendo que no amanhã, quem hoje vai chorando embora, também terá motivos pra sorrir".

Uma espécie de resposta à música da Pitty que diz que "memórias, não são só memórias", "Só Lembranças" diz: "só lembranças, só lembranças, só lembranças, e nada mais". É um ótimo exemplo de ultra-romantismo, trágico e irreversível: "Nos braços de outra qualquer, eu procuro me esquecer de quem me fez infeliz, mas eu sei que não vou ser feliz nunca mais, vai lembrança pra longe pra ver se eu consigo outra vez minha paz".

Mas, talvez sua música genialmente mais trágica e concisa seja Você Vai Partir: "Você vai partir, e eu vou ficar aqui, e aqui vou me acabar".

Uma música que tem uma letra das mais bonitas é uma que chama “Palavras Perdidas”, em que ele além dele cantar a genial frase “eu tenho medo, mais do amor do que da morte”, ele também critica as pessoas que apenas falam de amor, pois isso é fácil, o difícil é que as palavras sejam sinceras: “tenho medo que sejam mentiras estas suas palavras”, “falar de amor é muito fácil, pois todos falam, são palavras perdidas que você fala e logo se esquece”.

Romantismo

Nem só de tristeza são feitas as músicas de Bartô Galeno. Elas também retratam o quanto é doce e gostoso estar apaixonado, onde ele chega ao ponto de dizer que quer ver a mulher acordando despenteada; pense o quanto precisa estar apaixonado para querer algo assim? É paixão pura.

"Momentos coloridos": "Quero, quando chegar o amanhã, ver em meus braços, você despenteada, sorrindo feliz".

"Você": "Você que é pura de carinho, que está no meu caminho, no meu jardim você entrou, ", e no refrão: "Você, minha querida, minha amiga, minha vida, você, que em sua boca me mostrou o céu, você que tanto envolve a natureza do meu ego, você que é minha musa, que é meu se e é meu por que".

"Eu quero": "Eu quero, ver o seu corpo rolando na cama / eu quero ouvir você dizendo que me ama / eu quero em seus braços me perder / eu quero, ver amanhã na minha despedida / olhar você despenteada e ainda mal vestida / me abraçando e me pedindo pra ficar”.

A letra de “Imensa Euforia” mostra o que é de verdade um amor: “quero te dar o mundo em forma de amor, tudo farei para que não sintas uma dor”.

Desespero

"Esta Noite eu Preciso Te Amar" mostra um Bartô Galeno mais desesperado que noivo em festa de casamento, esperando a noite de núpcias: "deixa eu tocar o seu corpo na cama / pra ver você dizer que me ama / deixa, deixa eu sonhar / deixa eu fazer dos seus braços meu ninho / e esquecer que vivo sozinho / esta noite eu preciso te amar / quero, esta noite ter você ao meu lado / e viver os momentos sonhados / esta noite eu preciso te amar".

A melhor música: "O Grande Amor da Minha Vida"

Tem todos os elementos de um bom brega: é cantada a plenos pulmões, fala da desgraça de não ter a mulher amada, como seria bom estar com ela, e culpa o destino por essa desventura: "se eu pudesse neste momento estar contigo meu amor / nesta hora eu não seria um sofredor / eu seria o homem mais feliz do mundo / mas o destino a cada instante me separa de você / deste jeito eu sei que vou enlouquecer / na sua ausência, vou morrer na solidão". E pra fechar, ainda tem uma recitação: "Amor, não consegui gostar de mais ninguém. E sabe por que amor? Porque você é o grande amor da minha vida". Simples e perfeito.

"Não Vou te Perdoar": a questão do perdão na música brega

No brega, na maioria das vezes a traição não é suportada e nem perdoada, pois isso demonstraria fraqueza e até diminuição da masculinidade e virilidade do traído. Porém, pouquíssimas músicas falam com tanta precisão da questão do perdão na traição quanto em “Não vou te perdoar” de Bartô Galeno. A música também fala da vergonha que a traição causa, que seria pior que o ciúme. Mas no último verso, ele acaba cedendo, e a perdoa.
Preste atenção no ótimo arranjo, uma balada muito melancólica, com um phaser ou chorus muito legal na guitarra, que cai como uma luva para a letra extremamente angustiada:

Link: http://rapidshare.com/files/56440236/11-nao_vou_te_perdoar.mp3

Não Vou te Perdoar (Bartô Galeno)

Quando eu soube que você
Se envolvia com outro alguém
Eu senti uma coisa estranha
Não foi ciúme, foi vergonha

Pois eu nunca imaginei
Que você agisse assim
Quase não acreditei
Que bobo eu fui, pobre de mim

Nossas brigas passageiras
Me levaram a acreditar
Que durante a vida inteira
A gente fosse se amar

Não consigo entender
É difícil de aceitar
Atitude como essa
Chega mesmo a revoltar

Não sei se vou te perdoar
Eu não vou te perdoar
Não sei se vou te perdoar
Eu não vou te perdoar

...Mas eu vou te perdoar

Desgraça

Em "Nesta Casa Onde Morou Felicidade", além de um casamento desfeito, a desgraça é maior porque seus filhos não querem ouvi-lo nem como amigo.

Letras curiosas

Uma das suas letras mais criativas e curiosas é "Lembranças do Rei", que é feita inteira somente com nomes de músicas do Roberto Carlos, uma das suas maiores influências:

Malena, esqueça dele meu bem,
Quero ter você perto de mim,
Os velhinhos querem acabar comigo
Ninguém vai tirar você de mim

É papo firme, eu te amo, te amo, te amo
Eu estou apaixonado por você
O diamante cor-de-rosa, minha senhora
É meu, é meu, é meu

Tudo que sonhei, nada vai me convencer
Amigos, amigos, ciúme de você
Não quero ver você tão triste
Você é linda, não adianta nada

Não há dinheiro que pague
Ternura antiga

Em "Ela Não Vem", diz "Que bom seria, se meu bem chegasse agora, bem suadinha e se jogasse nos meus braços"

Carro Hotel

Bartô Galeno tinha uma fixação com carros em suas músicas. Além do clássico “No Toca-Fitas do Meu Carro”, há também “Carro Hotel”, uma engraçada descrição de um carro muito brega.
O começo da letra parece ter sido inspirada em “Calhambeque” do Roberto Carlos:

Pra vocês que não conhecem o meu carro
Vou decifrar mais ou menos como ele é

Depois ele faz uma descrição detalhada de todos os apetrechos do carro:

Tem toca-fitas, ar refrigerado e televisão
O meu carro é uma tremenda mansão

E no refrão, simplesmente genial, ele diz que o carro serve perfeitamente como motel:

Carro-Hotel, banco e cama
A gente ama, Olhando o céu

Depois vêm mais acessórios, e com aquela falta de modéstia que também aparece em “Calhambeque”:

Rodas cromadas, pneus tala-larga,
Faróis alto e baixo, teto solar
E é por isso que as gatinhas se amarram
E todas querem no meu carro passear

Outra música versando sobre o assunto carros e velocidade, só que aqui juntamente com os temas amor e morte, quase onipresentes em sua obra, é “Saudades de Rosa”, em que ele diz, com barulhos de carros acelerando ao fundo: “eu ontem tive tanta sorte, a malvada da morte andou perto de mim, eu no meu carro dei bobeira, numa brincadeira quase levo o fim, andava a toda velocidade, pra superar a saudade que andava junto a mim, esta saudade era de Rosa, (...) compreendi que estava errado, que não se deve morrer por amor”.

Timbres e Arranjos

Praticamente todas as suas músicas tem ótimos timbres, tanto de baixo, bateria, quanto de guitarras, cordas e sopros. Porém, algumas das músicas se destacam, com relação aos melhores arranjos:

"Quem ama tem ciúme" tem um solo espacial de sintetizador, bem típico de rock progressivo dos anos 70; impressionante, e impagável. A música é uma balada como a maioria das outras, mas na hora do solo, o som fica de uma loucura só.

Em "Você Vai se Arrepender" vemos Bartô Galeno botando pra quebrar em um funk-soul que não fica devendo em nada aos mestres do estilo. Mostrei para um amigo que é grande conhecedor e admirador de música black, que gostou tanto da música que pediu pra repeti-la umas três vezes.

"Vou Tirar Você Daqui" é um soul à la Roberto Carlos dos anos 70, mas tem um solo estrambólico de sintetizador que não fica nada a dever a Rick Wakeman.

A seqüência de "quase-rocks": "Esta Noite Eu Preciso Te Amar", "Coisas da Vida" e "Nosso Amor Já Morreu".

A linha de baixo de "Você me Pertence".

Atualmente

Bartô Galeno continua lançando discos, e embora não tenha mais a mesma voz, hoje já curtida por anos de cachaça, e os arranjos das músicas não serem tão bons quanto antigamente, as músicas continuam emocionadas e apaixonadas, muitas sendo dramaticamente exageradas, como um bom brega deve ser.

Os discos “Bartô, Simplesmente Bartô” e “Acorrentado a seus pés” são também recomendados aos fãs do brega. Em “Amor Caliente”, ele diz: “vou colocar o seu nome na chave do carro, vou me tornar refém da suíte de luxo do vigésimo andar do seu coração”, e em outra ele diz “é muito bom, é muito bom, beijo na boca com sabor de hortelã”. O seu filho que também está seguindo a carreira de cantor, com o nome de Bartozinho Galeno, tem uma voz boa, e compôs uma música muito boa para o disco.