quarta-feira, 3 de outubro de 2007

"O Sabor da Melancia" (Taiwan, 2005)





Direção: Tsai Ming-Liang

Esse é um filme polêmico, com alguns críticos classificando-o como péssimo ou como ótimo, não teve meio-termo. Com razão, pois o cineasta é um dos mais radicais da atualidade. Esse filme é uma mistura de filme típico oriental de arte (com pouquíssimos diálogos) com musical cafona com sexo explícito; e ainda consegue a proeza de fazer disso um universo coerente. A história do filme conta que em Taiwan houve uma seca terrível e o governo recomendou ao povo comer melancia, pela grande porcentagem de água da fruta, vê-se então no filme uma espécie de fixação com a fruta.

O principal defeito apontado pelos críticos seria o sexo bizarro presente no filme. Em uma das primeiras cenas do filme aparece uma mulher carregando uma melancia por baixo do vestido, como se estivesse grávida, aí senta numa escada e dá a luz a uma melancia. Logo depois, há uma filmagem de um filme pornô em que se vê uma mulher nua na parte de baixo deitada numa cama com uma melancia cortada no meio entre as pernas, chega um cara e começa a "cavucar" a melancia como se estivesse masturbando a mulher, no que ela geme como se realmente estivesse. Ao final, a melancia está destruída e os atores melados com melancia. Nessa hora teve gente que saiu injuriada do cinema em que eu estava assistindo.

A principal sub-trama do filme trata de uma moça que se apaixona por um cara, mas não sabe que o mesmo é ator pornô. Às vezes, logo depois de uma cena um pouco longa em que há interação sem diálogo dos personagens, aparece de repente uma cena musical com música estilo japonesa cafona e visual extremamente colorido e extravagante, como uma em que o ator principal aparece todo fantasiado tomando banho na caixa d'água do prédio; em outra, três garotas dançando, abraçando e beijando a estátua de alguém que parece ser o Mao-Tsé-Tung ou coisa do gênero, e em outra, há um cara vestido de pênis, com um chapéu em forma de glande, e várias dançarinas em volta, todas felizes.

O sexo explícito aparece por ocasião do personagem principal ser ator pornô, e então mostra-se o seu "trabalho", em que é praticado um sexo aborrecido e burocrático com todo o pessoal da produção em volta. A moça que está apaixonada por ele tenta o seduzir, e apesar dos dois se darem bem como amigos e namorados, na hora do sexo ele não mostra muita animação ou interesse. Uma das cenas mais emblemáticas do filme e que foi usada para divulgação, é uma em que ela o leva para a parte de filmes pornô de uma locadora e começa a mostrar as caixas dos filmes para que ele se anime.

Apesar da decepção que ela tem ao descobrir a profissão dele, ela não deixa de gostar dele; e a cena final é uma das mais radicais, pornográficas e românticas (ao mesmo tempo) já feitas no cinema. Vejo este filme como uma radicalização de elementos de um outro filme dele, "Vive L'Amour", onde também a pornografia e a poesia andam lado a lado, porém com a diferença de não ter cenas explícitas e nem musicais bregas. "O Sabor da Melancia" está entre os meus filmes preferidos, pela ousadia, beleza estética, radicalismo, criatividade e humor. Nota: 10

"Vive L'Amour" (Taiwan - 1994)



Direção: Tsai Ming-Liang

Apesar de não ter a mistura extravagante de elementos de "O Sabor da Melancia", a mistura entre poesia e pornografia deste também não fica nada a dever. O filme fala de um homem e de uma mulher que se conhecem, e quando eles começam a frequentar a casa dele para transar, descobrem que há um outro homem escondido na casa. Este homem que fica escondido é alguém muito tímido, e parece estar fugindo de algo, parece estar refugiado na casa, ele entra quando as pessoas estão distraídas. Mas o tempo passa e se descobre que ele está apaixonado por uma das pessoas do casal.

Era um dos poucos filmes "cult" na locadora perto da minha casa, e o comentário de um crítico dizendo que esse filme é um dos "raros filmes de um cinema que é essencial de se ver". Achei exagero, mas fui assistir o filme para comprovar ou contrariar o comentário. Nos vinte primeiros minutos o silêncio, a ausência de diálogos e acontecimentos me fez duvidar que o filme era realmente tudo aquilo. Porém, aos poucos as peças vão se encaixando, e com uma maestria impressionante.

Como em "O Sabor da Melancia", uma das últimas cenas é genial, em que apesar de ser crua e pornográfica, é também muito romântica. E também há uma cena belíssima, em que a certa demora em se manter nela é própria de alguns mestres, para assim melhor a contemplarmos: a moça se dirige, sozinha, a pé, para um lugar distante, senta-se num banco, e chora angustiadamente por minutos. Lembra o choro daquela clássica música do Barros de Alencar. Algumas pessoas gostam de ver o choro alheio, mas não sei se isso chega a ser um sadismo; Nelson Rodrigues disse uma vez que adora ver aquelas mulheres chorando em enterros, e que ele seria capaz de chegar até ela e dizer que até paga para ela chorar mais... Acho que ele gostaria bastante desta cena do filme.

Nota: 9

Filme - "Vício e Beleza" (Taiwan, 2001)




Direção: Cheng-sheng Lin

Outro filme de Taiwan, só que bem mais "pop", com mais diálogos e músicas A história fala de uma nova droga, que é uma semente, e que está fazendo sucesso; tem os traficantes, e uns pontos de venda em algumas ruas que são todos coloridos, e que ficam umas garotas bonitas, no padrão oriental, magrinhas, bastante claras, com cabelo bem preto e liso. Aliás, essa é uma das maiores qualidades do filme, a qualidade estética, imagens muito bonitas, não temendo ser extravagantes em termos de cores. Neste filme, como nos outros, também há um romance, neste caso, entre um jovem e uma jovem relativamente comuns. Ele trabalha numa confeitaria, ela trabalha num desses pontos de venda dessa nova droga. Ele começa a ser levado para o mundo do crime por um amigo. E o filme tem alguns tons de comédia, como por exemplo, uma cena em que o personagem principal está com seu amigo criminoso de madrugada com o carro parado em frente a um caixa eletrônico, então eles tem a idéia de amarrar uma corda no caixa e na caminhonete, e então andar com a caminhonete para destruir o caixa e eles pegarem o dinheiro, mas o que acontece é que o pára-choque do carro que acaba caindo; e o pior, foi filmado pelo sistema de segurança do caixa eletrônico, e no dia seguinte, aparece em todas as redes de televisão os idiotas aspirantes a ladrões. Nota: 6,5

Filme - "Anjos Exterminadores" (França - 2006)





É interessante assistir filmes que certos críticos classificam como péssimos, geralmente você vai tentando contrariá-lo, procurando qualidades; assim como quando dizem que é excelente, você vai procurando defeitos. Claro que isso não inclue chutar cachorro-morto, como filmes do Didi e da Xuxa. Geralmente isso acontece com filmes polêmicos, ousados. Por exemplo, o filme taiwanês "O Sabor da Melancia", todas as críticas falavam que era ou ótimo ou péssimo.

Ontem fui assistir o filme "Anjos Exterminadores", que foi classificado na Veja como péssimo, onde falam que o filme é uma "picaretagem com ares pornográficos". Só por isso já é curioso, pois, mesmo que o filme seja ruim, fica a curiosidade de saber qual o enfoque dado ao sexo para um determinado filme dito como artístico. E para melhorar, o enredo desse fala de um cineasta que quer fazer um filme experimental sobre o prazer das mulheres e os tabus. Os testes iniciais das atrizes já são de masturbação em frente à câmera. E dá-lhe muitas cenas de nús frontais femininos e masturbação, explícitas.

O tema da masturbação feminina é algo que me interessa e atrai bastante, fiz até uma pequena poesia intitulada "Romântica", que é assim: "será que ela ainda / se masturba / pensando em mim"; pois ao meu ver, a masturbação é uma das coisas mais românticas que podem existir. Claro que existem as masturbações meramente sexuais, mas as masturbações apaixonadas são mais intensas, e às vezes, é apenas o que resta para a pessoa apaixonada, quando esta não é correspondida. O tênue limite entre erotismo e pornografia, entre poesia e vulgaridade é um dos principais temas que tento desenvolver em meus poemas e na minha música, e este filme veio bem a calhar, e é um tema com o qual é muito perigoso lidar, para não descambar para a mera sacanagem.

Li num comentário em algum site que esse filme é meio auto-biográfico, pois apesar do filme ser uma ficção, e não um documentário, ele realmente fez experiências sobre sexualidade em alguns filmes, e foi acusado de assédio e exploração sexual das atrizes, e essa auto-reflexão contribui positivamente para o filme. A crítica também detona o filme sob o argumento de que há muito blá-blá-blá desnecessário como é próprio dos filmes franceses. Na minha opinião, só há uma cena em que esse papo fica um pouco cansativo, em que ele conversa em um bar com uma em que uma atriz que trabalhava com ele desiste de ser atriz, de resto, as conversas são interessantes, como as em que ele explica porque ele não quer atrizes pornôs para o filme, pois para estas se tocar em cena não seria uma transgressão, ao que mulheres que não são atrizes pornôs confirmam sua tese, dizendo que o ato de transgredir se tocando em cena é, em si, algo extremamente excitante.

As coisas ficam bem quentes quando ele encontra uma linda morena clara para o filme, que o convida para jantar num restaurante, e ela diz que vai sentir prazer em um lugar em que não é destinado a esse fim, e ela começa a se tocar lá mesmo, e descrevendo em detalhes para o cineasta, como por exemplo, dizendo que está toda molhada, uma das coisas que mais excitam um homem. Impressionante a tortura à que ele se submete devido a uma promessa que ele fez, que não iria tocar nas atrizes. Ele diz que tem uma surpresa para ela, que logo chegaria mais uma atriz no restaurante, a morena diz se ela seria uma rival, e ele diz que ao contrário, será uma provável parceira, pois para o seu filme, além de masturbação feminina, ele quer filmar sexo entre mulheres, mas que não sejam propriamente lésbicas, pela excitação que certos tabus provocam nas pessoas, em estar fazendo algo novo e coisas do gênero. As duas começam a se tocar no próprio restaurante, chegam quase a um êxtase, mas ele diz para esperarem que vai ser melhor, que ele vai levá-las para um hotel próximo. Lá chegando, fazem uma das mais lindas e poéticas cenas de sexo entre mulheres que já vi.

A coisa começa a degringolar quando as atrizes começam a se apaixonar por ele, mesmo sem ele nunca tê-las tocado, mas pela excitação que ele causou nelas apenas em estar assistindo-as e instigando-as. O filme, por ser meio autobiográfico, serve um pouco como defesa para o cineasta, porém há um fundo de verdade. Apesar de falar e filmar somente sobre sexualidade, ele é tratado como inocente, paternal e protetor; e acaba se tornando vítima das circunstâncias, por mexer com sentimentos e coisas tão fortes. É muito estranho e surreal, mas mesmo assim bom, o lado sobrenatural que existe no filme, com sua avó morta aparecendo para dizer para ele tomar cuidado que ele está correndo perigo; além de duas anjas caídas, filmadas como mulheres normais, jovens, de jeans e regatas, que vão ditando o destino dele e dando conselhos.

Apesar da crítica ser tão negativa na revista, vi que o filme é bom. A reflexão sobre tabus e sobre o perigo de mexer com coisas tão fortes é boa, e a sensualidade que ele conseguiu nas masturbações femininas e sexo entre mulheres é ótima, fez algo poético, sensível e muito excitante.

Nota: 7