domingo, 19 de agosto de 2007

Filme - Paris, Te Amo



"Disse, então, Almitra: Fala-nos do Amor.
Com uma voz poderosa ele disse:
Quando o amor vos chamar, segui-o,
Apesar de seu caminho ser duro e íngreme.
E quando suas asas vos envolverem, abraçai-o,
Apesar da sua espada escondida entre suas penas poder ferir-vos."

Assim escreve Khalil Gibran no livro "O Profeta".
Fui assistir o filme "Paris, Te Amo" muito mais pela forma do filme, composto por 18 curtas de 5 minutos para cada bairro, do que propriamente pela capital francesa, e sem saber que todos filmes tratavam do tema Amor. Uma das maiores qualidades do filme é que, quase sempre, o amor é mostrado com um sabor doce e amargo ao mesmo tempo, como no texto de "O Profeta", que continua assim:

"E quando ele falar convosco, acreditai nele,
Apesar de sua voz poder esfacelar vossos sonhos como o vento norte arruina o jardim
Pois mesmo quando quando o amor vos coroa, ele vos crucifica"

Eu gosto do formato de curta-metragem, no tempo de um filme normal, você consegue ver várias histórias, e ainda, muitas vezes o cineasta acaba fazendo um longa metragem arrastado e tedioso por não ter tanto assunto para uma hora e meia, quando a história principal é boa e poderia resultar um ótimo curta. (Um pequeno parêntese, já que o filme fala sobre amor... Minha vida tem sido mais de filmes curtas-metragens ultimamente... Depois de dois filmes longa-metragens mal sucedidos...)
Na minha banda Olhos de Guaxinim, praticamente todas as músicas falam de amor, e como esse filme é todo dividido em curtas, seria mais ou menos como se cada curta fosse uma música, daí que resultou uma maior identificação com o filme.

Não lembro dos nomes dos curtas, e também não sei todos os diretores de cada curta, então vou falando mais ou menos o que eu lembro pelo enredo. Claro que o resultado é irregular, alguns curtas são ótimos, outros nem tanto.

O primeiro curta com um cara tentando estacionar o carro, e nenhuma mulher olhando pra ele, até que ele socorre uma moça, é dispensável e esquecível.

O segundo é melhor, singelo e bonito; começa com três rapazes adolescentes que ficam mexendo com todas as mulheres que passam, até que uma garota muçulmana tropeça e cai, e um deles, europeu e não muçulmano, vai ajudá-la a levantar, eles conversam, trocam olhares, então ela vai embora; aí ele lembra que ela falou que iria na mesquita, então fica esperando-a sair, e logo depois sai um senhor junto com ela; ele fica receoso, inclusive quando ela apresenta os dois, dizendo ao pai que foi esse rapaz que ajudou quando ela caiu, o pai com cara de poucos amigos agradece e vai indo embora com a filha, o rapaz já estava dando tudo por perdido, mas ele e a moça trocam olhares, ela olha pra trás para vê-lo; e aí que vem a parte mais bonita: o pai percebe (e deve pressupor que os dois devem estar com medo dele), e convida o rapaz a acompanhá-los, e ainda puxa assunto com o rapaz e diz mais sobre a filha para ele, e os três vão andando e conversando alegremente.

Logo depois vem o de Gus Van Sant, regular, tem temática gay. Um rapaz vê outro rapaz numa oficina e começa a conversar, tenta puxar assunto a qualquer custo, fala de vidas passadas, almas gêmeas, trocam telefones, mas o outro quase não responde. porque não entende muito o francês, depois corre para ligar para o que estava falando.

O curta dos irmãos Coen é um dos mais engraçados do filme. Um turista, nerd e desprovido de charme, passa por vários apuros em uma estação de metrô; ele está lendo o guia, quando passa um menino e joga chumbinho nele, e também passa por situações inusitadas, agradáveis e desagradáveis, por conta de um casal de namorados, que ele insistiu em ficar encarando, ao passo que seu guia lhe recomendava o contrário.

Um dos que eu menos gostei, foi um que é sobre uma mãe latina que deixa o filho no berçário, canta uma música, vai para o seu trabalho e canta a mesma música para a filha da patroa. Tudo bem, tem o lado social, mas eu achei chato. Depois que eu vi que esse curta era do brasileiro Walter Salles. Bom, tem a ver... Ainda não vi "Diários de Motocicleta", mas deu pra perceber que ele gosta de falar sobre temas sociais.

O curta que se passa no bairro chinês, do Christopher Doyle, foi um dos que eu mais gostei, surrealista, psicodélico, colorido, trata de um vendedor de cosméticos, estilo europeu, que tem ir visitar o salão de beleza de uma chinesa com fama de má; imagina que ela dá uma surra nele, depois eles se apaixonam. Lembra um pouco "O Sabor da Melancia". Absurdo e ótimo!

O curta que tem Julienne Binoche fala de morte e também tem surrealismo, mas sem chamar tanto a atenção quanto o anterior.

O curta de Wes Craven, que fez o "Drácula 2000", é uma hilária história, bastante romântica, com vampiros.

O curta que mostra a Torre Eiffel, com um ótimo mímico, é uma bela homenagem ao mais famoso monumento da cidade, e é um dos curtas mais bonitos e com maior identificação com a cidade, visualmente falando inclusive.

Claro que, se tratando de Paris, tinha que ter um episódio mostrando as boates e prostitutas. Um senhor elegante entra em uma boate, e uma prostituta de meia idade tenta seduzi-lo, mas não como as mais jovens do local, e sim com um charme todo próprio e dizendo coisas como "eu posso lhe dar coisas que elas nunca lhe darão". Tem muita coisa relacionada com a música brega nestes curtas, e esses é um dos que a relação é mais forte, pois a relação entre cliente e prostituta é bem romântica, assim como as músicas em que o cliente quer tirar a moça daquela vida.

E, também numa temática parecida, um dos melhores é aquele protagonizado por Gena Rowlands e pelo "exemplo de cafajeste" Ben Gazaara, onde eles, já idosos, numa conversa afiada, falam sobre o divórcio, e cada um está com parceiro bem mais jovem. (A respeito de Ben Gazzara, recomendo assistir "Morte de um Bookmaker Chinês", do Cassavetes, em que ele está num ótimo papel como dono de boate de striptease, cafajeste e romântico com as meninas ao mesmo tempo).

Tem a história do cara que quando vai falar que para a mulher que vai se separar para ficar com a amante, fica sabendo que a esposa tem leucemia avançada, desiste de terminar, trata bem da esposa, acaba apaixonando-se novamente por ela.

O "Place des Fêtes", com dois atores negros, tem uma ótima estética e uma história bastante triste. Outra história triste é do menino cego que se apaixona por uma menina atriz, e ela termina o namoro com ele.

Mas o melhor fica pro final, uma pérola, o extremamente simpático e agridoce curta do cineasta que fez o "Sideways", em que uma turista norte-americana de meia idade, obesa e solteirona, viaja sozinha para Paris. É engraçado que dá para perceber que ela acabou de aprender francês, e o sotaque americano é bastante forte; e com essa voz ela começa a contar como é viajar e passear sendo uma pessoa solitária (bom, me identifico com ela nisso, muitas vezes gosto de passear sozinho, por opção), ela diz que não se sente triste, mas que sente falta de alguém para poder dizer coisas como: "olha! que paisagem bonita!"... É... Sem palavras!

Concluindo, o filme é uma bela declaração de amor ao Amor, que é, quase sempre, doce e amargo ao mesmo tempo; mas toda a emoção e felicidade que ele traz, talvez seja o que mais valha a pena na vida. Ou talvez a única. E eu chorei porque... meu coração é brega!

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